Depois de mais de um ano fechado para reformas, o museu Jacquemart-André, de Paris, reabre com uma exposição de obras-primas da Galeria Borghese, de Roma, um dos principais endereços culturais da capital italiana. O empréstimo inclui quadros de Ticiano, Rafael, Boticelli, Rubens e Caravaggio, obras que raramente viajam.
Patrícia Moribe, de Paris
A Galeria Borghese é fruto de um colecionador compulsivo e pouco escrupuloso, o cardeal Scipione Caffarelli-Borghese (1577-1633), sobrinho de Camillo Borghese, eleito papa Paulo V. Numa era em que a igreja era sinônimo de poder, o cardeal amealhou uma impressionante coleção de esculturas antigas e pinturas – no final do século 17, a família Borghese possuía cerca de 800 peças.
Para abrigar o acervo, Scipione construiu a suntuosa Villa Borghese, inspirada em mansões romanas, em meio a um parque em uma das sete colinas de Roma.
Uma parte da coleção de antiguidades foi vendida à Napoleão Bonaparte e transferida para o Louvre após o casamento arranjado de sua irmã Pauline com um rico príncipe da família Borghese. Para evitar a dispersão do tesouro, o Estado italiano compra a coleção e transforma a magnífica mansão em museu público, a Galeria Borghese.
A história conta um episódio que demonstra bem o caráter pouco lícito do cardeal amante das artes. Ele convence o tio papa a confiscar, em 1607, mais de cem obras de Cavalier d’Arpino (1568-1640), então um dos artistas mais cotados de Roma. O pretexto foi posse ilegal de armas de fogo. Em seguida, o generoso papa presenteia o sobrinho com o espólio retido de d’Arpino.
“A exposição é o resultado de um encontro incrível com Francesca Capelletti, diretora-geral da Galeria Borghese, que estava procurando um local para exibir sua coleção fora de Roma, durante reformas”, explica Christophe Beth, administrador do museu Jacquemart-André. “E o que poderia ser melhor do que uma exposição sobre essas obras-primas absolutas da coleção Borghese para a reabertura do museu?”, diz.
“O objetivo foi escolher as obras mais emblemáticas e, ao mesmo tempo, que fossem compatíveis com o museu Jacquemart-André, que era uma residência, uma mansão do século 19. Os espaços são de tamanho humano, portanto, não pudemos trazer grandes esculturas. Mas trouxemos quadros de Da Vinci, Caravaggio, Rafael e muitos outros. E criamos um espaço para as esculturas de Bernini”, diz o administrador francês.
O conjunto das obras a serem expostas foi escolhido em colaboração entre a Galeria Borghese e o curador da exposição, Pierre Curie, que é conservador do museu Jacquemart-André.
A exposição vem atraindo muitos visitantes, ocasionando filas e opiniões variadas.
“A exposição me surpreendeu. Ela é pequena, distribuída em algumas salas. As obras mostram o gosto refinado dos colecionadores. Mas é muito cheio, as pessoas se empurram e não há espaço para se apreciar as obras”, conta a guia turística Zilda Figueiredo.
“É uma coleção interessante, gostei da ideia de ver essas obras em Paris, pois assim não preciso viajar até Roma”, disse a aposentada holandesa Kathleen.
“O museu Jacquemart-André é uma residência concluída em 1875, encomendada por Édouard André, seu proprietário, um rico herdeiro de uma família de banqueiros de Paris. O hedonismo foi algo que ele buscou ao longo de sua vida, enriquecendo sua casa com coleções de arte, quadros, esculturas, móveis e objetos. Com sua esposa Nelly Jacquemart, ele viajou o mundo para adquirir obras de arte”, relata Beth.
A visita à suntuosa mansão do casal Jacquemart-André é uma viagem no tempo, com obras do século 15 ao século 18, incluindo quadros de Van Dyck, Rembrandt, Canaletto, Mantegna, Botticelli, Fragonard e outros. O casal, que não tinha filhos, legou tudo ao Instituto da França para que fosse transformado em museu, inaugurado em 1913.