“Trump se torna um epicentro para a organização da extrema direita global”, afirma cientista político


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Nov 06 2024 8 mins  

A vitória de Donald Trump nas eleições americanas gera profundas mudanças e implicações políticas, econômicas e sociais, não apenas nos Estados Unidos, mas também em escala global. O cientista político Thomás Zicman de Barros aponta que o retorno de Trump à Casa Branca deve fortalecer os movimentos de extrema direita e avalia que a derrota de Kamala Harris pode provocar uma grande reflexão sobre os rumos do Partido Democrata.

Segundo Zicman, uma das chaves para compreender essa vitória está na autocrítica necessária ao Partido Democrata. “Muitas vezes buscamos colocar a culpa nos outros, mas os democratas precisam fazer sua autocrítica”, afirma. Embora a economia americana esteja em crescimento e o desemprego em queda, ele observa que há uma percepção de que a qualidade do emprego não acompanha esse avanço. “A sensação de que o custo de vida aumentou para muitos americanos é real, e o Partido Democrata tem perdido apoio da classe trabalhadora”.

A vitória de Trump, marcada por uma campanha agressiva, sugere também que o Partido Democrata precisa se reconectar com a classe que historicamente sempre esteve em seu campo de apoio, segundo o especialista. “Os democratas se tornaram, em grande medida, um partido de elites urbanas, o que criou um distanciamento da classe trabalhadora”, avalia. Esse afastamento, somado à percepção de que o governo Biden não cumpriu promessas essenciais, abriu caminho para a volta do republicano à Casa Branca.

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Aproximação com eleitorado antes desfavorável

Trump se aproximou dessa base tradicionalmente associada aos democratas, defendendo políticas protecionistas e prometendo reforçar a economia americana. Além disso, sua retórica encontrou espaço até mesmo entre eleitores negros e latinos, historicamente desfavoráveis à sua candidatura, considera o cientista político.

“Trump cresceu nesses grupos, e isso se deve ao fato de que ele já foi presidente. Na pior das hipóteses, para alguns eleitores, voltar ao passado parece seguro”, explica Zicman, do Instituto de Ciências Políticas de Paris, a Sciences-Po.

Ele acrescenta que Trump retornou “muito mais forte do que em 2016, dominando o Partido Republicano, que agora conta com uma base de burocratas experientes e alinhados ao seu projeto”. Essa consolidação de poder pode representar um risco significativo para a democracia americana, especialmente se considerada a recente conquista republicana no Senado, antes dominada pelos democratas, e a presença de uma Suprema Corte majoritariamente conservadora.

“A Suprema Corte foi moldada por Trump para apoiar uma visão de poder presidencial com menos limitações. Isso fragiliza a própria democracia americana”, alerta.

Retrocesso para minorias e fortalecimento da extrema direita

O impacto da vitória de Trump, no entanto, vai além das fronteiras americanas. De acordo com Thomás Zicman de Barros, Trump deve intensificar o discurso anti-imigração e promover retrocessos em políticas de direitos, especialmente para mulheres e minorias.

No cenário internacional, sua reeleição pode fortalecer movimentos de extrema-direita pelo mundo, com consequências diretas para países como o Brasil.

“Trump se torna um epicentro para a organização da extrema-direita global”, afirma ele. Ele lembra que um dos motivos que impediram Jair Bolsonaro de questionar o resultado das eleições no Brasil foi o rápido reconhecimento da vitória de Lula por Joe Biden, mas que esse cenário poderia mudar com Trump no poder.

A relação entre Estados Unidos e Brasil também pode ser afetada no campo econômico, segundo ele. Trump prometeu aumentar tarifas de até 20% sobre produtos de países parceiros, o que pode prejudicar as exportações brasileiras.

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Além disso, há uma crescente guerra comercial com a China, principal parceiro comercial do Brasil. “Se essa guerra comercial se intensificar, o Brasil será prejudicado ao ser forçado a escolher entre Estados Unidos e China”, diz Zicman.

Outro ponto de preocupação é a questão ambiental. Com a conferência do clima COP sendo sediada em Belém em 2025, o retorno de Trump, que durante seu primeiro mandato retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris, pode enfraquecer esforços globais para combater a crise climática. “Trump é um negacionista climático. Sua reeleição acelera a deterioração da situação climática global”, conclui o especialista.