Com uma delegação recorde de 400 startups, o Brasil dominou a participação internacional no Web Summit em Lisboa, que começou segunda-feira (11) e terminou nesta quinta-feira (14). No evento, o país mostrou sua força crescente no cenário tecnológico mundial.
Luciana Quaresma, correspondente da RFI em Portugal
O evento é considerado a principal conferência de tecnologia global e se tornou a vitrine perfeita para o potencial brasileiro e para atrair investimentos estrangeiros em seus setores tecnológicos em expansão.
A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) investiu R$ 11,5 milhões para viabilizar a presença das startups no evento, fomentando parcerias e impulsionando o crescimento das empresas do país.
A expressiva participação brasileira reafirma a posição do país como um centro de inovação em ascensão. “A ApexBrasil, em parceria com o Sebrae, vem trabalhando para a inserção de novas startups no cenário internacional. Ampliamos o nosso espaço e além das palestras e encontros temos as empresas inovadoras. Aqui temos as empresas selecionadas pelo Web Summit num total de 80. As outras são empresas inovadoras”, explica Maria Paula Velloso, Gerente de Indústria e Serviços da ApexBrasil.
Este ano marcou um crescimento exponencial em relação ao anterior, mas o impacto brasileiro transcende os números. A delegação se destacou pela notável diversidade, fruto de um esforço consciente para incluir empresas de diferentes regiões do país, rompendo com a concentração tradicional nos grandes centros urbanos.
Parcerias estratégicas com a Central Única das Favelas (CUFA) permitiram a inclusão de empresas de favelas e lideradas por mulheres, além de um foco especial no ecossistema do Nordeste, garantindo uma representação mais ampla e abrangente do potencial inovador brasileiro.
“A Apex olhou a questão da diversidade. A gente fez parceria com a CUFA para podermos trazer empresas oriundas da favela. Fizemos também com a Rede Mulher Empreendedora para trazer empresas lideradas por mulheres, também focamos no ecossistema norte-nordeste com a preocupação de trazer mais empresas de outras partes do Brasil que não fossem apenas sul-sudeste. Ampliamos a participação brasileira, mas com uma maior diversidade”, explica Maria Paula Velloso.
Soluções inovadoras da Amazônia
A Wood Chat, startup 100% acriana, exemplifica essa diversidade. Sua inteligência artificial revolucionária soluciona problemas cruciais na Amazônia: a identificação de espécies e a falta de dados de imagens. A tecnologia brasileira agora alcança a Europa, auxiliando compradores de madeira a certificar a origem e a espécie das toras e peças, principalmente na Europa e nos Estados Unidos, os maiores importadores de madeira amazônica.
A ferramenta desenvolvida pela empresa faz o reconhecimento de madeira em tora, ou seja, no corte da madeira transversal. "O DNA da madeira está justamente neste tipo de corte, então produzimos uma IA que fizesse esse reconhecimento e identifica o nome botânico, a origem da madeira e da família dela. Na nossa Floresta Amazônica temos entre 40 e 300 espécies por hectare, então imagina o tamanho da nossa diversidade", frisa Fernanda Onofre, criadora da Wood Chat.
"Resolvemos um problema da Amazônia que era a identificação de espécies e também os dados de imagens que não existiam. Com a nossa tecnologia conseguimos resolver estes dois problemas”, afirma. “Os maiores compradores da madeira da Amazônia são a Europa e os Estados Unidos, então quando esta madeira chega aqui na Europa, por exemplo, como cliente Wood Chat, ele consegue fazer o reconhecimento das toras e das peças de madeiras que podem chegar laminadas e se certificar de que aquela madeira é realmente o que comprou, reconhecida pelo Chat”, completa.
Cleo Sousa, diretora da Escola de Negócios da Favela, que busca transformar a realidade socioeconômica das favelas por meio da educação e da promoção de negócios, destaca a presença de dez empreendedores de diferentes estados, selecionados em um evento voltado para o protagonismo de comunidades em situação de vulnerabilidade.
"Na hora que a gente conseguiu esta parceria através deste super apoio da ApexBrasil, com a CUFA e a Escola de Negócios da Favela, decidimos que teria que ser algo relacionado com tecnologia, algo que em algum momento já tenha tido destaque em seu estado, top 10 dentro da Expo Favela. Essa foi a base para a escolha das startups que estão aqui com a gente”, afirma Cleo. A diretora adianta que para 2025 a Escola de Negócios deverá trazer trinta startups para o Web Summit.
Histórias de Sucesso
Janaína Cristina, de São Paulo, é fundadora da startup Seja do Mundo, cuja missão é democratizar o acesso ao mundo para todos os brasileiros. "Quando vi a Torre Eiffel brilhando, percebi que o mundo ia muito além de Guaianazes e então criei a Seja do Mundo", afirma a empreendedora. A startup faz consultoria de cidadanias portuguesa, italiana e espanhola. "Temos uma pegada diferente, pois levamos o assunto para as favelas do Brasil. Estar aqui hoje é um grande divisor de águas porque a gente está tendo a oportunidade de ter um contato direto com pessoas que podem fazer a diferença e nos ajudar a conquistar os nossos objetivos”, diz.
Raphael Ribeiro, fundador da Sankofa Sustentabilidade, uma startup carioca de engenharia periférica e soluções ambientais, utiliza a tecnologia para promover mudanças sociais e econômicas sustentáveis. O nome Sankofa, explica, vem do idioma de Gana que significa voltar ao passado e ressignificar o presente para construir o futuro.
"Através do movimento da CUFA, Escola de Negócios, da Expo Favela, fui selecionado entre 400 pessoas e fui a única empresa de engenharia periférica local. A partir disso começaram a surgir outras oportunidades como essa, de hoje estar aqui na Web Summit. É um verdadeiro presente, pois eu nunca tinha saído do Brasil. É uma realização”, explica Ribeiro.
Portugal é parceiro estratégico
A presença brasileira no Web Summit extrapolou a participação direta no evento. Encontros com outras delegações e um “Dia da Inovação” com empresários portugueses enriqueceram a experiência.
Startups brasileiras já estabelecidas em Portugal também estiveram presentes, reforçando a crescente relação entre os dois países no cenário de inovação. Empresários brasileiros que se estabeleceram em Portugal corroboraram a percepção do país como uma plataforma estratégica para o acesso ao mercado europeu, oferecendo um ambiente propício para investimentos e incentivos a startups.
Eduardo Migliorelli, CEO da Atlantic Hub, reforça essa visão. “Temos aqui 70 empresários hoje e mais 400 startups que vieram para cá e estamos conectando. Eu fico até arrepiado de tanto orgulho de brasileiros ajudando brasileiros a criar um mindset global entre os empreendedores", destaca
"Chega de ficar só pensando localmente e desenvolver negócios para crescer dentro do Brasil. O Brasil é incrível, tem uma economia brutal, mas a Europa e os EUA estão esperando estes bons negócios que o brasileiro tem de melhorar e mostrar para fora”, afirma Eduardo.
Sua empresa já apoiou a internacionalização de centenas de empresas brasileiras e, neste ano, trouxe um número significativo de startups para o Web Summit, representando diversos setores. Segundo Eduardo, Portugal oferece um ambiente favorável para investimentos, especialmente para brasileiros, e se tornou um dos melhores pontos de partida para empresas brasileiras que desejam acessar mercados globais.
"Com estabilidade política, incentivos fiscais para startups, e um ecossistema de inovação em crescimento, o país é uma porta de entrada estratégica para o mercado europeu. Além disso, a conexão cultural e a facilidade de adaptação fazem de Portugal um destino atrativo para empreendedores brasileiros que buscam internacionalizar seus negócios”, afirma Migliorelli.
Paddy Cosgrave, CEO do evento, destacou a importância dessa crescente participação brasileira, ressaltando a força e a inovação das startups do país no cenário global e o protagonismo feminino no comando das iniciativas. “A variedade e a qualidade das propostas apresentadas pela delegação brasileira reforçam a posição do país como um polo de inovação crescente na América Latina e no mundo”, disse.