Depois de uma fase experimental, a França ampliará a cobrança, em 2025, de uma multa de € 135 para carros, motocicletas e scooters que emitirem mais de 85 decibéis de ruído nas vias públicas. No câmbio desta sexta-feira (20), esse valor equivale a cerca de R$ 865.
A França tem milhares de motoqueiros e motoristas que gostam de ronco de motor, de escapamento aberto, fedido e barulhento, sem o menor respeito pelos ouvidos e pulmões dos outros. Mas esses abusos vão custar caro a partir do ano que vem.
O Centro de Informação sobre o Ruído (CidB), uma organização pluridisciplinar de interesse público, que promove uma série de ações e estudos contra a poluição sonora, fez um teste de madrugada em Paris com um scooter sem silenciador no escapamento e chegou a um resultado impressionante. O barulho provocado pelo motoqueiro em um trajeto de 7 km, entre a praça da Bastilha e o Arco do Triunfo, acordou 11 mil pessoas.
Em 2025, o combate aos escapamentos barulhentos, adulterados pela remoção dos silenciadores ou por falta de manutenção adequada entra em nova fase. Um novo modelo de radar, chamado Hydra, desenvolvido para multar aqueles que não respeitam o limite de 85 decibéis, está em fase final de homologação e será instalado nas principais cidades do país.
O Hydra foi desenvolvido por uma entidade chamada Bruitparif, que desde 2004 reúne representantes da sociedade civil e do poder público para avaliar a poluição sonora causada pelo trânsito, realizar pesquisas e propor soluções na região Île-de-France, onde fica Paris.
Esse radar, projetado num poste alto, equipado com câmeras, sensores de ruído e microfones, é capaz de calcular em frações de segundos os decibéis emitidos por veículos, motos e scooters, mesmo em um contexto de tráfego denso. Acima dos 85 decibéis, o radar registra o excesso de ruído, fotografa a placa do infrator e transmite a multa para uma central de arrecadação.
Desde 2022, o Hydra é testado em fase experimental em sete cidades francesas, incluindo Paris. O equipamento também mediu a poluição sonora em Berlim, Genebra, Bruxelas e Barcelona. O aparelho está em fase final e homologação e será implantado em todo o território francês no segundo semestre deste ano. Até lá, policiais continuarão a fazer a fiscalização nas ruas e aplicar a multa de € 135.
Poluição sonora causa de doenças
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera níveis sonoros acima de 65 decibéis (dB) como poluição. Para o tráfego rodoviário, a recomendação da OMS é de no máximo 53 dB durante o dia e abaixo de 45 dB à noite e de madrugada, portanto bem abaixo do valor de referência adotado neste momento na França.
Estudos científicos têm comprovado que o barulho é o segundo fator ambiental que mais causa problemas de saúde e perde apenas para a poluição atmosférica, segundo a OMS. A poluição sonora pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares, provocar distúrbios metabólicos, zumbido crônico no ouvido, perda de audição, entre outras patologias.
Recentemente, deputados de esquerda tentaram aprovar na Assembleia francesa um imposto adicional na compra de motocicletas, mas perderam a batalha. Por outro lado, as associações da sociedade civil que militam contra o barulho e a poluição no trânsito estão comemorando a instalação desse novo modelo de radar.
Sem pegar no bolso do usuário, difícil provocar mudança de hábito
Os lobbies pró e contra medidas de adaptação a cidades mais resilientes e livres de poluição são ativos na França, e as mudanças requerem um tempo de aceitação. Na experiência francesa, as multas caras têm sido dissuasivas.
Até abril de 2024, motocicletas e scooters eram isentos de passar por uma vistoria técnica periódica, mas obrigatória para carros há muito tempo. Essa fiscalização feita em oficinas especializadas certificadas pelo governo verifica se as emissões sonoras e de gases estão de acordo com os índices previstos na lei.
Os motoqueiros sempre alegaram que já poluíam menos do que os carros e, por isso, não deveriam ser fiscalizados. Durante meses, eles fizeram vários protestos para denunciar a vistoria técnica, que custa em média de € 60 a € 80 (R$ 380 a R$ 507, dependendo das cilindradas), mas foram derrotados.
Os franceses reclamam de viver num Estado que “atazana” o cidadão com normas, multas e impostos excessivos. Mas o poder público vem aplicando, em etapas, a Lei da Normatização da Mobilidade, promulgada pelo Ministério da Transição Ecológica em 2019, que visa, entre outros objetivos, promover investimentos de infraestrutura e combater a poluição sonora e atmosférica nas cidades.
A prefeitura de Paris, sob a gestão da socialista Anne Hidalgo, tem sido incisiva em suas políticas nessa área. Os carros têm sido banidos do centro da cidade, substituídos por bicicletas e quilômetros de ciclovias. Em fevereiro deste ano, o valor cobrado pela hora de estacionamento dos modelos SUV, considerados mais poluentes, foi triplicado. Contra a incivilidade nas ruas, em 2023, os parisienses aprovaram, em um referendo proposto pela prefeitura, a proibição dos patinetes elétricos de aluguel, porque os usuários não respeitavam os pedestres e causavam acidentes.